Superação
Superação

Não foi fácil no início e não é menos fácil agora.

Sempre saio pelas ruas da cidadela, quando todos já dormiram. Melhor assim, pois não gosto de chamar a atenção. As sombras das noites frias são a minha melhor companhia.

E mesmo sabendo dos meus receios fico divagando enquanto caminho no meu destino até que, naquela noite, ouvi uns murmúrios vindo da pracinha no centro. Era uma típica de cidade pequena tendo um coreto, uma fonte, algumas vias muito limpas, flores e árvores frondosas além de muitos bancos. Em um desses um jovem casal se amava. Os gemidos da mulher me ativaram algo. Fiquei atônito. Escondido na noite aproximei-me ao máximo para não ser visto. Esfregavam-se naquela dança de cheiros e tons. Sem que soubessem vi que de uma janela, uma alma curiosa também os observava. Nenhum crime fica impune e nada do que achamos que fazemos vive sem testemunhas.

Não perceberam, então, que além de mim e daquele na janela, uma besta se aproximara.

Mal pude conter meu assombro. Era um lobo. Em verdade, muito mais que um comum. Enorme, se postou nas duas poderosas patas traseiras enquanto, arfando baixo, preparando seu bote surpresa, teria o casal como a refeição farta com que devia estar sonhando. A criatura tinha os olhos vermelhos e, com a boca aberta, vi a nojenta saliva cair-lhe pelos lados. Aproximou-se sorrateiro até que, armando seu bote fatal, resolvi sair de minha plácida observação partindo-lhe para cima com a fúria de mil mães que perderam seus bebês. Começamos uma luta desigual. Nisso, o casal, assustado, saiu aos gritos. Já abalado pelos golpes da criatura descomunal e mais forte que eu, ouvi disparos de arma de fogo. A criatura, atingida várias vezes, encarou-me querendo desfechar um golpe final em minha goela ao que um último tiro pareceu decepar-lhe a pata direita que já erguera. Emitiu um terrível urro e, em fuga destrambelhada, desapareceu na noite.

Cheio de dor arfava ao solo desolado esperando por uma ajuda qualquer. Nisso, em pouco, vi que se aproximou alguém. Tentando sobreviver dos ferimentos notei que era uma senhora idosa com uma espingarda de repetição em um roupão colorido. Olhou-me assombrada enquanto dizia:

- Será hoje a noite dos horrores?

Armou para mais um disparo e cravou-me certeiro tiro na testa. Logo depois, já saindo do corpo, vi desfalecido e banhado de sangue o que restou da gárgula que eu era naquela triste vida de criatura das sombras sendo, enfim, liberto de todo o meu sofrimento...

 

Autor: Jurandir Araguaia.

 

Comentário do Autor: ¨Todo aquele que der a sua vida por amor de mim, salva-la-á¨... (Jesus)

 

 

 

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